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Por que realizar a abertura integral do mercado de energia no Brasil?



Abertura integral do mercado de energia elétrica significa permitir que as indústrias e comércios de pequeno porte, bem como os consumidores residenciais, possam substituir o seu fornecedor de eletricidade. Atualmente o Brasil ainda não oferece essa alternativa pois estagnou no desenvolvimento do seu mercado atacadista de eletricidade e não avançou nas demais reformas necessárias para levar o mercado de eletricidade até o varejo. E por que o Brasil precisa implantar a abertura integral do mercado? A resposta é simples: a população brasileira arca com a 3º maior relação do mundo entre tarifa residencial e renda per capita (gráfico abaixo).


A abertura do mercado faz parte das reformas necessárias para recolocar o custo final de energia elétrica do Brasil em patamares aceitáveis. Nesse artigo, comentaremos a experiência nos EUA, Austrália e Grã-Bretanha e abordaremos algumas das etapas necessárias para alcançar esse objetivo no País.


Conforme comentado, o gráfico abaixo ilustra que, embora o Brasil esteja na 18º posição das maiores tarifas residenciais em valores brutos, o País ocupa a 3º colocação da maior relação tarifa/renda per capita. Elevadas tarifas de eletricidade impactam a competitividade do país: a menor disponibilidade de renda dos consumidores de energia para seus gastos ou poupança arrefecem o crescimento econômico. Isso sem mencionar o aumento da inadimplência e perdas comerciais (furto de energia) realimentando o ciclo vicioso.



O processo de abertura do mercado nos EUA é um excelente estudo de caso: como a decisão da abertura integral do mercado no varejo é homologada por cada estado, é possível fazer comparações dos custos de energia elétrica entre os estados que decidiram pela abertura de mercado e os que optaram por manter tarifas reguladas (optaram por não abrir o mercado). De maneira em geral, os EUA tiveram, por uma série de razões estruturais, redução nos custos de energia elétrica entre os anos 2010 e 2019. Porém, os estados que implantaram a abertura integral do mercado obtiveram uma redução mais significativa dos custos com energia elétrica, conforme pode ser visto no quadro abaixo elaborado a partir de fontes primárias.


Conforme exposto na figura abaixo, 14 estados norte-americanos abriram seu mercado para o varejo (full retail choice). Os demais estados subdividem-se entre aqueles que implantaram uma versão muito limitada de mercado no varejo (partial retail choice), os que iniciaram a abertura de mercado, mas a interromperam após a crise da Califórnia no início dos anos 2000 (considered but rejected), os estados que mantiveram as taifas reguladas (regulated) e os estados que estão avaliando a abertura de mercado (under consideration).


Os estados com abertura integral de mercado (full retail choice) reduziram os custos com energia elétrica entre os anos de 2010 e 2019 em 31%, ao passo que os estados que mantiveram a estrutura regulada reduziram os custos em 18% no mesmo período. O Brasil teve um incremento real de 9,7% no período.


Fonte: Victor Ribeiro a partir de https://www.eia.gov/electricity/state/


O Arizona, um dos estados que estão avaliando a abertura de mercado, analisou as políticas dos 14 norte-americanos que implantaram o mercado varejista de energia a fim de identificar qual dessas políticas adotar, caso essa seja a decisão da população (o tema ser decidido em um plebiscito). Umas das principais conclusões advindas da análise e exposta no relatório publicado pela Arizona Public Service Company (APC) foi de que a principal diferença entre os estados que tiveram êxito na abertura de mercado e os estados que não implantaram o mercado varejista é que os primeiros, ao contrário dos segundos, não faziam parte de um RTO (Regional Transmission Organization) ou ISO (Independent System Operator). Nesse sentido, um dos aspectos que entrará na avaliação da APC será os custos a serem arcados pelos contribuintes para a implantação de ISO no estado e realizar a integração elétrica do Arizona a um RTO existente. Conforme exposto pela APC, o mapa dos estados que tiveram êxito na implantação do full retail choice (cor vinho do mapa) é quase coincidente ao mapa dos RTOs e ISOs norte-americanos (segundo mapa).



Trazendo a discussão para o Brasil, a abertura do mercado urge devido à insustentável posição que o País ocupa: possui a 3º maior relação tarifa/renda per capita do mundo. Adicionalmente, é injustificável um atraso de quase duas décadas na abertura do mercado para o varejo no Brasil, tendo em vista ser um sistema com boa integração energética, ao contrário da situação do Arizona - no qual está colocando no centro da decisão da abertura do mercado o levantamento dos custos para a implantação de um ISO e sua integração energética a um dos RTOs existentes nos EUA.


Enfim, o que é necessário para promover a abertura integral do mercado brasileiro de energia elétrica no Brasil? É fundamental prover informações ao consumidor com agilidade e transparência, facilitar a comparação de ofertas dos fornecedores de eletricidade, criar condições para que o consumidor exerça suas escolhas e por meio dessas escolhas obter redução de seus custos com energia elétrica. Para garantir que isso aconteça, uma série de medidas devem ser debatidas, avaliadas e implantadas para conduzir uma transição entre o modelo atual vigente e a abertura integral do mercado brasileiro de energia elétrica no Brasil. No mês passado, a Abraceel (Associação Brasileira dos Comercializadores de Energia Elétrica) encaminhou ao Ministério de Minas e Energia (MME) e à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) um estudo elaborado pela Thymos Energia abordando em detalhes os aspectos a serem observados na abertura do mercado no Brasil e solicitou a abertura de uma consulta pública sobre o assunto. O estudo da Thymos Energia pode ser encontrado no link: https://abraceel.com.br/destaques/2020/11/estudo-abraceel-thymos-abertura-integral-do-mercado-de-energia-eletrica/


Victor Ribeiro é Gerente Regulatório na Thymos Energia e mestrando em Engenharia Elétrica pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MG).




Artigo originalmente publicado no site Broadcast Energia, em 15.12.2020.

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