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Cláusulas de contrato de fornecimento


Desmistificando as principais cláusulas e como se obter vantagens através de suas aplicações.


Então você comprador, recebeu uma demanda, buscou novos fornecedores caso não estivesse confiante nos fornecedores existentes em sua base, avaliou a melhor fonte de fornecimento, negociou as condições comerciais, cadastrou o item devidamente em seu sistema e…fim? Nada disso! Se o item em questão estiver classificado como um item “A” ou “B” em sua curva ABC, o desenvolvimento e a assinatura de um contrato de fornecimento são imprescindíveis.

Contrato bem feito é aquele que esclarece às partes “quem faz o quê”. O ideal é que o contrato seja negociado, assinado, armazenado e não seja necessário consultá-lo durante a relação com o fornecedor. Entretanto, como em uma relação pessoal, muitas vezes as partes tomam caminhos diferentes e em algum momento a parceria pode não mais fazer sentido e aí mais importante do que saber “quem faz o quê”, é saber “quem não precisa fazer o quê”.


Veja abaixo as principais cláusulas, que podem parecer assustadoras devido aos seus termos técnicos e geralmente em inglês. Vamos começar com as cláusulas de menor complexidade:




  • Ajuste de Preços - Talvez a mais simples das cláusulas de um contrato comercial, entretanto uma das que mais pode evitar dor-de-cabeça no futuro. É a cláusula utilizada para definir como e quando o preço será reajustado. Pode-se por exemplo determinar que um índice será usado (inflação, IGPM, IPCA, LME e tantos outros dependendo da categoria negociada) para um reajuste anual, ou então pode-se determinar a aplicação de uma fórmula de preços. Pode-se também definir que o reajuste será feito a partir da aplicação de um índice, somente quando a variação for menor ou maior que “x%” - o chamado “trigger” (do inglês gatilho). Qualquer que seja o seu mecanismo de preço, é imprescindível que isso esteja bem claro no contrato e que o fornecedor entenda qual é a sua responsabilidade caso vocês negociem um trigger. Isso certamente economizará tempo para ambas as partes quando a aplicação do reajuste for necessária. Esta cláusula é classificada como sendo de baixa complexidade porque os fornecedores esperam que esta cláusula faça parte do contrato. Você pode encontrar alguma resistência para negociar com o fornecedor, mas dificilmente para adicionar esta cláusula no contrato.


  • Rebate - Este é um dos termos em inglês que infelizmente a tradução literal não ajuda caso você não entenda o conceito. A palavra mais próxima em português é desconto e a aplicação ou não desta cláusula faz parte negociação comercial com o fornecedor. Digamos que você trabalha em uma indústria de perfumes e compra frascos de vidro do fornecedor “X”. O objetivo da sua empresa é obviamente obter lucro com grande volume de vendas de perfumes. Se a sua empresa vender cada vez mais perfumes, consequentemente cada vez mais frascos de vidro serão necessários e o volume do fornecedor “X” vai aumentar. Aumentando-se o volume de compra, aumenta-se a quantidade de frascos produzidos pelo fornecedor (e aí, você comprador precisa pressionar o fornecedor para otimizar sua produção), ganhando-se em escala e gerando-se um menor custo para os frascos. Essa diferença entre o custo original dos frascos de vidro produzidos com um menor mínimo de compra e o custo considerando-se o novo (e maior) mínimo de compra, é comumente devolvida ao comprador, o que chamamos de rebate. Pode-se definir rebate como um incentivo a venda. A diferença entre rebate e desconto simples é que normalmente o desconto simples é recebido no ato da compra (ou venda), enquanto o rebate é recebido após um determinado período - nos contratos em que eu gerencio por exemplo, o rebate é recebido normalmente a cada 6 meses ou 12 meses, quando o fornecedor envia um “reembolso” para a empresa. Considerada uma cláusula de baixa complexidade uma vez que sua aplicação está vinculada ao aumento de vendas, que deve ser um dos objetivos de ambas as partes.


  • Força Maior - Também considerada de baixa complexidade uma vez que geralmente a probabilidade dessa cláusula ser executada é baixa, entretanto ela existe e o Coronavírus está aqui para provar. Durante a pandemia, eu precisei executar algumas cláusulas de força maior, especialmente com fornecedores asiáticos. Se você se recorda, o início da pandemia se deu durante o ano-novo chinês, entre 25 de Janeiro e 11 de fevereiro de 2020. Neste período, muitos trabalhadores chineses deixaram suas casas para visitar familiares em outras províncias (o que obviamente aumentou a contaminação pelo até então desconhecido vírus). Como forma de contenção da doença, o governo chinês proibiu a circulação de pessoas ou seja, os trabalhadores foram impedidos de retornar às suas casas e aos seus postos de trabalho. Alguns dias depois, os fornecedores da China começaram a declarar força maior, uma vez que não podiam cumprir com suas obrigações contratuais - neste caso, não tinham trabalhadores o suficiente para produzir e entregar conforme previamente acordado. E o Coronavírus é apenas um dos motivos - podemos citar como motivos de força maior furacões, enchentes, incêndios, explosões, entre outros. Essa cláusula é utilizada principalmente para proteger ambas as partes, caso algo extraordinário aconteça e não seja possível cumprir com as obrigações do contrato. Mas atenção, é proibido (além de ilegal) executar uma cláusula de força maior, se esta realmente não for a situação. Por exemplo, se você teve um problema na sua produção e você possui excesso de inventário de um determinado componente, você não pode e não deve declarar força maior e solicitar que o fornecedor pare de entregar estes componentes apenas para que o seu excesso de inventário seja exaurido, enquanto você continua a receber outros itens de outros fornecedores. Normalmente o fornecedor pode solicitar uma auditoria na sua empresa para comprovar a força maior. E finalmente, pensando-se na mitigação de riscos, você comprador, deve entender quais dos seus itens são estratégicos e desenvolver um plano de contingência com novos fornecedores em diferentes regiões geográficas.


  • Plano de Contingência - Esta cláusula é utilizada principalmente para proteger o comprador e normalmente é adicionada como uma sub cláusula da cláusula de força maior. Ela nos permite requerer ao fornecedor que nos envie quais são os seus planos de contingência caso não seja possível adquirir as matérias-primas necessárias para fabricar o seu item através de sua fonte original de fornecimento. Voltemos ao exemplo do frasco de vidro utilizado para exemplificar o rebate: Digamos que você compre o frasco de vidro (cujas principais matérias-primas são sílica, calcário e alumina) do fornecedor “A”. O fornecedor “A” deve informar qual é o plano de contingência dele, caso a produção do seu fornecedor de sílica seja atingido por um motivo de força maior. Cabe a você comprador avaliar o risco envolvido nos planos de contingência do seu fornecedor, para determinar se além dos planos de contingência, você precisa de outros fornecedores (de frascos de vidro por exemplo), para mitigar o seu próprio risco. Normalmente os fornecedores de produtos compartilham mais facilmente os seus planos de contingência, enquanto os fornecedores de serviços são mais resistentes, por medo da concorrência que podem gerar.


No próximo post, vamos discutir as cláusulas contratuais de média complexidade: Exclusividade, Competição e Direito inicial de recusa. É importante que você comprador entenda o seu papel na negociação contratual: Todas as cláusulas citadas e as que ainda vamos discutir devem refletir como você quer gerenciar a categoria e o fornecedor. É importante consultar o departamento Jurídico da empresa quando houver dúvidas, entretanto a palavra final deve ser do gerente de relacionamento com o fornecedor.


Escrito por Flávia Paiva | 07/12/2020

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